25 de set. de 2011

SEM CRIME, MAS COM PENA EM REGIME FECHADO

Rio - Dentro do Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, cada dia é vivido à espera da liberdade. Especialmente por aqueles que, apesar de não terem sido condenados por crime algum, ‘cumprem pena’ no local. Cercadas pelos altos muros dos presídios, 16 famílias sofrem com as privações do sistema penitenciário. Convivem com a inconveniência de ter a casa revistada e, assim como os 17 mil vizinhos presidiários, dependem dos agentes para receber visitas. As famílias já moravam no terreno antes da construção do complexo, formado por 23 unidades prisionais. Aos poucos, viram o número de presídios aumentar até que todo o conjunto foi cercado por muros e guaritas. Esquecidos dentro da área de segurança máxima, os moradores lutam por indenização para seguir a vida em outro lugar. “Morar em um complexo de presídios é horrível. Já entraram na minha casa para procurar drogas e agora colocaram um agente em frente à minha porta. É muito constrangimento sair de manhã e dar de cara com um guarda me vigiando. Parece até que sou uma das presas”, reclama a moradora X. As ‘visitas’ de agentes penitenciários são mais frequentes em algumas casas, mas não surpreendem moradores. Acostumados com as rígidas regras que garantem a segurança do complexo, eles abrem as portas para os agentes sem discutir. “Já revistaram minha casa 12 vezes, mas nunca encontraram nada. Os guardas falam que receberam denúncia e perguntam se podem entrar para fazer revista. Como não tenho nada a temer e não devo nada a ninguém, autorizo”, conta o comerciante Héber da Silva Vilela, 60 anos, que mora lá há quase 30. Já as visitas de parentes e amigos podem ser mais complicadas, dependendo do plantão. X. conta que até sua mãe, na época com 65 anos, foi barrada na portaria. “Eles só falam que é ordem, mas não explicam o porquê. Depende de quem está na guarita”, conta.

Festa com lista de CPFs na guarita

Os moradores sabem que dependem dos guardas em seu dia a dia. Festas de aniversário, por exemplo, precisam ser muito bem planejadas para não terminarem antes de começar. Os mais precavidos mandam relação com nome e CPF de cada convidado para os agentes da guarita. Eventuais problemas no acesso de alguém que é esperado podem nem chegar ao conhecimento do aniversariante, já que o sinal de celular é bloqueado. Para evitar constrangimento, X. já não recebe mais visitas: “É muita humilhação. Pedi para ninguém ir mais na minha casa para evitar o risco de ser barrado ou revistado. Isso quando um guarda não cisma com algum morador”.

Sem previsão para pagar indenização

Moradores querem deixar o complexo, mas dependem da indenização. Poucos conseguem alugar imóveis perto dali mesmo tendo casa própria em Gericinó. Há 4 anos, a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária teria fotografado as casas e prometido indenizar todos. “Falaram que vão nos indenizar conforme as fotos. Por isso, não fazemos melhorias. Não vou investir e depois perder dinheiro”, diz Héber, cujo quarto tem reboco caindo. A Seap confirma não ser “conveniente” fazer obras agora, mas não dá prazo para a desapropriação, que depende de “exigências”.

Convivência incompatível e insegura

Para Elizabeth Sussekind, professora de Direito da PUC-Rio e UniRio, o estado deveria ter retirado os moradores antes de começar a construir o complexo. Para ela, a presença deles compromete a segurança das unidades. “A primeira coisa deveria ser desalojar moradores e remunerá-los. Eles não escolheram morar dentro de um sistema prisional. Foi o sistema que escolheu o terreno deles. Os dois são incompatíveis”, afirma. Em nota, a Seap diz que os moradores recebem tratamento digno e que não há permissão para revistar suas casas.

Fonte: O Dia Online.

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